NEV na mídia | Jornal da USP no Ar: Prisão por consumo de drogas gerou gastos de R$ 2 bilhões ao País

28/06/2024

Paula Ballesteros, pesquisadora associada ao Núcleo de Estudos da Violência da Universidade de São Paulo (NEV/USP), deu uma entrevista ao programa Jornal da USP no ar 1ª edição, na manhã de 27 de junho, a respeito da política antidrogas brasileira e as consequências dessa disputa para o estado e a sociedade. Em evidência, está a […]

Paula Ballesteros, pesquisadora associada ao Núcleo de Estudos da Violência da Universidade de São Paulo (NEV/USP), deu uma entrevista ao programa Jornal da USP no ar 1ª edição, na manhã de 27 de junho, a respeito da política antidrogas brasileira e as consequências dessa disputa para o estado e a sociedade.

Em evidência, está a viabilidade da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) nº 45, de 2023, que visa mudar o artigo 5º da Constituição de 88 para a criminalização da posse e do porte de entorpecentes e drogas afins, independentemente da quantidade. Esse tema destaca-se após os acontecimentos desta terça-feira, 25, no Supremo Tribunal Federal (STF) no processo de descriminalização do porte para uso de cannabis e a consequente definição da diferença entre usuário e traficante.

Para Ballesteros, “o tema das drogas é um tema que envolve, para além das políticas públicas, uma esfera moral, uma visão das pessoas sobre o consumo de drogas. Isso tem a ver também com opiniões pessoais sobre essa situação, e tudo isso acaba contaminando o debate, que deveria ser mais racional”.

“Você prende pessoas com pequenas quantidades de droga, que vão ao sistema penitenciário, não têm condições de se manter e dentro do sistema penitenciário criam dívidas com essas facções criminosas. Saindo das unidades prisionais, acabam tendo que prestar serviços ou até ficam dependentes dessas facções. Tanto que o que a gente vê hoje em dia é que o crime organizado só se fortalece”, completa a pesquisadora do Núcleo.

 

Link original: https://jornal.usp.br/radio-usp/prisao-por-consumo-de-drogas-gerou-gastos-de-r-2-bilhoes-ao-pais/

 

Matéria na íntegra |

 

“Você prende pessoas com pequenas quantidades de droga, que vão ao sistema penitenciário, não tem condições de se manter e dentro do sistema penitenciário criam dívidas com essas facções criminosas – Foto: Rawpixel/Freepik

A prisão por consumo de drogas gerou gastos de R$ 2 bilhões ao País, calcula o Atlas da Violência, que dedicou capítulo especial para confrontar a PEC 45, que quer levar à prisão por  posse de qualquer quantidade de drogas. Paula Ballesteros, pesquisadora do Núcleo de Estudos da Violência da USP, explica mais o assunto.

Paula Ballesteros – Foto: NEV – Núcleo de Estudos da Violência da Universidade de São Paulo

O tema da política antidrogas é muito presente na sociedade. Há tempos, o debate vem sendo travado tanto no meio legislativo quanto no judiciário, no entanto, a pesquisadora acredita que os critérios levados em consideração no debate brasileiro não são os mais adequados. “O Brasil não tem uma tradição de pensar suas políticas legislativas e suas leis a partir do impacto legislativo. Costumeiramente, a legislação vai no sentido de dar uma resposta à opinião pública, que não necessariamente se constrói a partir de evidências ou a partir de uma busca por apoio eleitoral. O tema das drogas é um tema que envolve, para além das políticas públicas, uma esfera moral, uma visão das pessoas a respeito do consumo de drogas. Isso tem a ver também com opiniões pessoais dessa situação e tudo isso acaba contaminando o debate, que deveria ser mais racional”, crítica.

O Atlas da Violência faz um cálculo do custo que a política tem acarretado ao Estado brasileiro. Para a professora, esses dados não estão sendo levados em consideração por quem toma as decisões sobre o assunto. “Já temos evidências de que essa política do encarceramento não funciona. Então, do ponto de vista da eficiência de gestão pública, essa medida é ruim. Os recursos estão sendo mal utilizados. O que o encarceramento traz para a sociedade? Mais violência. Essas pessoas são submetidas a um sistema prisional que não mantém condições de segurança, fortalecendo o discurso de facções criminosas e facilitando a adesão das pessoas a elas”, elucida.

“Você prende pessoas com pequenas quantidades de droga, que vão ao sistema penitenciário, não têm condições de se manter e dentro do sistema penitenciário criam dívidas com essas facções criminosas. Saindo das unidades prisionais, acabam tendo que prestar serviços ou até ficam dependentes dessas facções. Tanto que o que a gente vê hoje em dia é que o crime organizado só se fortalece”, segue.

 

Política repressiva não funciona

A professora ressalta, ainda, que a política repressiva não surte efeito nos padrões de consumo das pessoas. “As pessoas não deixam de usar drogas ou não deixam de se envolver com drogas porque existe essa política repressiva. Essa é uma lógica que não tem funcionado. As pessoas não deixam de cometer crimes relacionados ao tráfico porque existe um aumento do encarceramento”, segue.

Sobre os gastos, a especialista afirma que têm maneiras melhores de gerir a questão, mas, por serem medidas que demoram mais para surtir efeitos, não são olhadas pelos parlamentares. “Têm duas maneiras que apresentam resultados de médio e de longo prazo. A prevenção, ou seja, você tratar a questão da droga de uma perspectiva preventiva a partir das escolas, não no sentido de assustar os adolescentes, mas de educá-los. Na história mundial, sempre houve o uso de drogas, algumas ilícitas e outras lícitas, é necessário um aprofundamento no tema desde cedo. Então tem um aspecto cultural aí que precisa ser muito bem aprofundado, mas que é uma política de longo prazo. Por outro lado, olhar as organizações criminosas pelo viés de suas atividades econômicas; as facções estão envolvidas em diversas outras atividades criminosas. O Estado deve atuar no desmantelamento dos fluxos de orçamento e financeiro para sufocar suas atividades”, finaliza.