Mesmo com a rearticulação do órgão para o enfrentamento dessa prática ilegal, a especialista atenta para diversos desafios no contexto brasileiro, como o processo desde a denúncia até a responsabilização do torturador. Maria Gorete explica que a vítima se vê muitas vezes desamparada ao realizar a denúncia e, mesmo quando o faz, há uma série de complicações na investigação dos casos. “A gente tem uma dificuldade na apuração da denúncia e na comprovação da lesão. Então, a perícia está muito despreparada para lidar com esse tipo de violação”, discorre.
Maria Gorete também traz luz ao protagonismo das ações de responsabilização individual do autor do crime sem obter um panorama mais amplo das estruturas onde esses crimes são recorrentes. A questão do crime de omissão também é negligenciada, uma vez que, apesar de existir uma lei, segundo a pesquisadora, não há qualquer tipo de culpabilização daqueles que permitem ou se omitem diante das violações.
Outro desafio apontado pela pesquisadora é o próprio julgamento da sociedade diante do assunto, uma vez que ainda existe uma mentalidade permissiva acerca do ataque à população carcerária. “A gente tem programas de televisão que instigam e mostram constantemente cenas de violência urbana com apresentadores que defendem uma narrativa extremamente punitivista e contra os direitos básicos dessa população”, explica. Assim, em sua visão, a mídia sensacionalista age diretamente na construção dessa opinião pública que, não apenas apoia uma suposta luta contra o crime, como também legitima o uso da violência.
“Existe uma legislação bastante consistente direcionada à prática de tortura, no entanto, eu acredito que ainda há pouca visibilidade ou nenhum tipo de política voltada às vítimas”, pondera a pesquisadora. Nesse sentido, há necessidade de cuidado após todo o processo judicial para a responsabilização, ou seja, de políticas de apoio psicológico e psiquiátrico para as vítimas se fazem essenciais.