Como participar de uma revista científica sobre questões sociais?

09/10/2023

Iniciativas como o caso de um dossiê em revista científica aberto até 31/10 para formatos livres de texto e imagem, podem incentivar adolescentes a se integrar ao universo acadêmico   Tanto quem não faz parte do universo acadêmico, seja antes de ingressar em no Ensino Superior, quanto quem está na fase de estudos, na graduação […]

Iniciativas como o caso de um dossiê em revista científica aberto até 31/10 para formatos livres de texto e imagem, podem incentivar adolescentes a se integrar ao universo acadêmico

 

Tanto quem não faz parte do universo acadêmico, seja antes de ingressar em no Ensino Superior, quanto quem está na fase de estudos, na graduação ou na pós-graduação, frequentemente acredita que participar de um periódico científico não tem relação com suas atividades ou que é algo de difícil acesso. Mas, principalmente na área de humanas, é possível participar da produção dessas revistas das mais variadas formas, seja enviando um artigo acadêmico com todas as regras e exigências ou, como neste caso, com produções de formato distinto.

Uma oportunidade como essa está com prazo aberto até 31 de outubro de 2023: os pesquisadores do Núcleo, Aline M. M. Gomes, André Vilela Komatsu, Debora Piccirillo, Renan Theodoro Oliveira do programa de pesquisa NEV-CEPID/Fapesp, principal atividade de pesquisa do Núcleo de Estudos da Violência, são organizadores de um dossiê especial intitulado “Actitudes de infancias y juventudes frente a la policía” que será lançado na Revista Latinoamericana de Ciencias Sociales, Niñes y Juventud em seu 22° volume.

Os pesquisadores responsáveis pelo dossiê, que atuam na área acadêmica vinculados ao NEV/USP, pelo programa NEV-CEPID, buscam para a 4° seção do dossiê produções de crianças e adolescentes que tenham relação às forças de polícia.

Isso inclui experiências de encontro entre jovens e policiais, a frequência dessas interações, suas potenciais consequências e a percepção dos jovens sobre as instituições policiais, bem como iniciativas e movimentos liderados por jovens para abordar questões relacionadas à violência policial.

Essas experiências podem ser retratadas em formatos dos mais diversos: podem ser textos ou imagens, até vídeos e manifestações artísticas, poesias.  Quem preferir enviar relatos também pode fazer no formato de entrevista, por exemplo.

Para enviar esses conteúdos, a pessoa interessada deve acessar a página oficial de submissões da revista e verificar todos os requisitos para participação, começando por:

  • Fazer um registro na plataforma da revista;
  • Clicar em “Fazer uma Nova Submissão”.

Na página oficial, estão descritos os formatos e requisitos para envio dos artigos acadêmicos. As orientações detalhadas sobre os envios específicos da 4° seção ao longo do documento, em espanhol. A maioria dos navegadores ativa um tradutor automático, caso isso não aconteça, segue abaixo uma tradução para facilitar:

“2.1 Seções terceira e quarta

Nestas seções são publicados outros tipos de produção intelectual, que estão reunidos na terceira seção (relatórios e análises) e quarta (revisões e resenhas):

Artigo de reflexão (ensaio): documento que apresenta análise crítica ou reflexão teórica sobre determinado tema; mas, diferentemente do artigo teórico, não deriva de pesquisa formal. O autor ou autores devem esclarecer o processo interpretativo realizado. Este tipo de artigo também deve acomodar suas referências ao estilo APA (2020). Somente serão publicados ensaios que o Conselho Editorial considere como contribuição significativa para o conhecimento da área.

Entrevistas: realizadas com especialistas na área infanto-juvenil, apresentando conversas de interesse e atualidade. O entrevistador pode acrescentar comentários, pontos de vista ou desenvolvimentos teóricos que nutrem o documento.

Cartas ao editor: posicionamentos críticos, analíticos ou interpretativos sobre os documentos publicados na revista que, na opinião do Comitê Editorial, constituem importante contribuição para a discussão do tema pela comunidade científica. Essas cartas estão incluídas na quarta seção.

Outros: também são recebidas breves análises de obras, material audiovisual, eventos, processos locais e projetos em andamento que sejam originais e de interesse de pesquisadores sociais ou outras pessoas. Da mesma forma, sistematizações de trabalhos relacionados a meninas, meninos e jovens ou produções próprias.

Como esses documentos não possuem status de artigos científicos e não são revisados ​​por pares, podem ter formato mais livre (embora devam manter padrões de citação). Porém, dada a sua natureza inédita, deverão passar pelo estudo de originalidade e correção de estilo no processo editorial da revista.

Acesse o link da página com o conteúdo completo de orientações para submissões: https://revistaumanizales.cinde.org.co/rlcsnj/index.php/Revista-Latinoamericana/about/submissions

 

 

Formatos livres mas também artigos acadêmicos

Pesquisadores e adolescentes também podem enviar artigos acadêmicos. Mesmo quem nunca teve a oportunidade de criar um artigo acadêmico tem essa chance, já que não há restrição de idade para submeter artigos para revisão em periódicos. Obviamente, é preciso apresentar muita seriedade, dessa forma construir parcerias com pessoas que já tenham experiência pode ser um caminho. A coautoria com um público mais adiante na área acadêmica é uma porta de entrada para saber mais sobre esse ambiente e incentivar novas pessoas a participarem.

Nesse sentido, para Renan Theodoro Oliveira, mestre em sociologia pela USP, pesquisador do NEV/USP e um dos organizadores do dossiê, “o principal desafio no início da carreira é as pessoas acreditarem no potencial que possuem. É importante que elas valorizem suas pesquisas e acreditem que elas merecem ser publicadas. Atualmente, a academia está passando por mudanças em relação ao passado. Fala-se muito sobre o desamparo psicossocial enfrentado pelas pessoas na pós-graduação. Portanto, a primeira coisa que as pessoas precisam saber é o quanto seu trabalho é relevante e que publicá-lo é importante. ”

É importante estimular a participação de jovens com vários tipos de produção no Dossiê; no entanto, caso tenha ficado interessado em escrever um artigo nos moldes acadêmicos, ou talvez queira saber mais sobre o cenário, veja algumas dicas que podem te auxiliar:

  1. Leitura das diretrizes: Acesse o site da revista escolhida e leia atentamente as diretrizes para autores. Essas diretrizes fornecerão informações detalhadas sobre o formato do artigo, requisitos de estilo, extensão, citação, referências, entre outros.
  2. Preparação do manuscrito: Escreva o seu artigo seguindo as diretrizes da revista. Certifique-se de que sua pesquisa esteja completa, bem estruturada e que todos os elementos, como resumo, introdução, métodos, resultados, discussão e conclusão, sejam abordados adequadamente. Revise e edite o manuscrito várias vezes para garantir clareza, coesão e coerência.
  3. Formatação e preparação dos arquivos: Verifique a formatação exigida pela revista para o envio do manuscrito. Geralmente, os artigos devem ser formatados de acordo com um estilo específico (por exemplo, o ABNT) e os arquivos devem estar em formato compatível (geralmente, DOC, DOCX ou PDF).
  4. Submissão do artigo: Acesse o sistema de submissão online da revista e siga as instruções para enviar o seu artigo. Geralmente, será necessário preencher informações sobre os autores, título do artigo, resumo, palavras-chave e selecionar a categoria adequada para o artigo.
  5. Processo de revisão por pares: O artigo passará por uma revisão por pares, na qual especialistas na área avaliarão o trabalho. Aguarde o período de revisão, que pode levar várias semanas ou meses. Os revisores fornecerão feedbacks e recomendações para melhorias no artigo.
  6. Revisão e resposta aos revisores: Analise cuidadosamente os comentários dos revisores e faça as revisões necessárias no seu artigo. Prepare uma resposta detalhada, que aborde cada comentário e explique as alterações feitas. Envie a versão revisada do artigo e a resposta aos revisores para a revista.
  7. Decisão final: Com base nas revisões e na sua resposta, a revista tomará uma decisão final sobre a aceitação, rejeição ou revisão adicional do seu artigo. Dependendo da decisão, você poderá ser solicitado a fazer mais alterações ou enviar uma versão final para publicação.

 

Cenário no Brasil

Mesmo para pessoas experientes, publicar um artigo em uma revista acadêmica envolve várias etapas e pode ser intimidador submeter textos e produções próprias para análises de avaliadores desconhecidos, cuja abordagem e avaliação têm sido classificadas, nos últimos anos, como excessivamente rigorosas. Além disso, a questão do financiamento das instituições públicas e privadas emerge como uma barreira limitadora para inúmeros pesquisadores no País. A ausência de recursos impacta negativamente a capacidade de realizar pesquisas de qualidade, adquirir equipamentos adequados e financiar projetos de longo prazo.

Essa barreira financeira se manifesta em diversos momentos das fases de pesquisa. Adicionalmente, muitos pesquisadores enfrentam problemas relacionados à infraestrutura disponibilizada pelas instituições, como questões logísticas, abastecimento e dificuldades estruturais. Um ambiente adequado é um desafio significativo para a realização de pesquisas no Brasil em diversas áreas de conhecimento. Isso inclui laboratórios, equipamentos científicos avançados, acesso a bases de dados especializadas e bibliotecas com amplo acervo, até mesas, computadores e acesso à internet.

As causas dessas questões citadas são, em muitos casos, a burocracia e complexidade do sistema, que podem ser demorados e complexos. A obtenção de autorizações éticas, a submissão de projetos em agências de fomento e a prestação de contas dos recursos são alguns passos desafiadores e com diversas fases extensas para muitos pesquisadores que precisam aguardar prazos de meses ou até anos.

Maiara Côrrea, doutoranda no Programa de Pós-graduação em Sociologia da Universidade de São Paulo (PPGS/USP) e pesquisadora do NEV/USP, aponta que “minha experiência tem sido um pouco penosa, não apenas pela produção geral, que é natural na dinâmica da produção científica, mas principalmente devido ao tempo de espera para a publicação dos artigos em boas revistas. É relevante mencionar que quando se é um pesquisador ou pesquisadora no início de carreira, não somos avaliados da mesma forma que pessoas que já têm renome e reconhecimento na área”.

A pesquisadora destaca ainda que a principal, embora não seja a única, dificuldade na área acadêmica no Brasil é a conciliação entre a docência e a pesquisa. “A dificuldade em conciliar a carreira docente, ou seja, a necessidade de dar aulas, com a produção científica em si. Porque sabemos que a carga de trabalho dos professores nas universidades é muito alta, com muitas turmas e trabalhos para corrigir. É um trabalho bastante duro e que exige muito. Ao mesmo tempo, você tem a obrigação e a necessidade de continuar produzindo ciência. O problema é que você precisa fazer essas duas coisas ao mesmo tempo”, completa Côrrea.

Essa luta por incentivos e reconhecimento é outro desafio importante, afinal a carreira acadêmica muitas vezes enfrenta dificuldades em termos de estabilidade financeira, progressão profissional e reconhecimento institucional. Essas circunstâncias que envolvem a produção científica brasileira geram um debate de décadas no País e, nesse contexto, Fernando Afonso Salla, doutor em Sociologia pela Universidade de São Paulo (USP) e pesquisador do Núcleo de Estudos da Violência da USP, aponta que um dos principais desafios diz respeito à circulação dos conhecimentos produzidos, que poderiam trazer incentivos à área e contribuir para o avanço científico.

“Os meios para uma ampla difusão do conhecimento no Brasil ainda são acanhados. As editoras universitárias não dão conta de publicar as principais obras e as editoras privadas são movidas mais pelos interesses de mercado e pouco pela relevância das descobertas do meio científico. Os desafios quanto à carreira acadêmica não são poucos. O número de universidades públicas cresceu bastante nas últimas duas décadas e ampliou os horizontes para a inserção de professores e pesquisadores. Embora as universidades privadas tenham também se expandido, as condições de trabalho são instáveis na maior parte delas e os incentivos à produção acadêmica muito menores”, aponta Salla.

Além disso, a falta de colaboração e interdisciplinaridade entre pesquisas e pesquisadores é mais uma das questões que contribui para esse cenário. A cultura acadêmica no Brasil possui pouca interação entre diferentes temas e instituições. Essa falta de conexão entre os campos de estudo e as instituições limita a capacidade de obter bolsas e outras formas de fomento. Além disso, a ausência de networking e contatos relevantes pode restringir a habilidade de abordar questões complexas e encontrar soluções inovadoras.

Renan Oliveira aponta que existe outra fase complexa: “Além de publicar, é essencial escrever de forma coerente e adequada ao formato acadêmico. Seja um texto teórico ou empírico com base em dados, é fundamental apresentar argumentação sólida. Por si só, é um exercício ansioso, pois geralmente você se sente sozinho na academia”. No entanto, o pesquisador acrescenta que ter o apoio de colegas mais experientes e trabalhar em equipe desde o início da carreira é essencial e pode ser uma saída.

Ao abordar a questão dos contatos e networking, é importante mencionar outro aspecto terceirizado na produção científica: a falta de disseminação e acesso ao conhecimento. A divulgação dos resultados, fases e impactos alcançados pelo desenvolvimento científico é comparativamente baixa em relação a outros países. Essa situação é em parte consequência da escassez de recursos disponíveis para as instituições governamentais nos últimos anos. Veja o infográfico elaborado pela revista Pesquisa FAPESP em 2021 que aponta a evolução dos recursos do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações de 2009 até 2021:

Fonte: Pesquisa Fapesp 06/2021

 

“Estamos vivendo uma fase de transição política e os recursos destinados às universidades, à produção científica devem ser retomados, depois de um verdadeiro desastre durante os governos Temer (2016 a 2018) e Bolsonaro (2019 a 2022) que golpearam severamente o meio científico com cortes de recursos. Sem recursos financeiros não se faz avançar a ciência em todos os campos de conhecimento. Investir em ciência e tecnologia é ponto crucial para alavancar o desenvolvimento econômico e social do país. A produção científica deve antes e acima de tudo contar com recursos públicos que são mais garantidores da distribuição geral dos benefícios para a sociedade. Os recursos privados são importantes para muitos setores, mas não devem ser os principais responsáveis pela produção científica de um país”, comenta Salla.

A falta de visibilidade de mídias voltadas para assuntos científicos dificulta o acesso dos pesquisadores que desejam compartilhar seus resultados, assim como de outros interessados em leitura e pesquisa, e também do público em geral que tem pouca familiaridade com a produção acadêmica brasileira.

No entanto, de acordo com uma matéria da Agência Brasil, a confiança na ciência ainda é expressiva no Brasil. Segundo o estudo “Confiança na Ciência no Brasil em tempos de pandemia”, divulgado em 12 de dezembro de 2022, a maioria dos brasileiros (68,9%) confia ou confia muito na ciência. O estudo foi conduzido pelo Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Comunicação Pública da Ciência e da Tecnologia (INCT-CPCT), com o apoio do CNPq e da Faperj. Ainda assim, é importante destacar que esse percentual já foi maior: o Índice do Estado da Ciência da 3M, também de 2022, registrou um índice de confiança de 90% da população com a ciência e, em comparação com o dado indicado anteriormente, observa-se uma tendência de queda.

 

Iniciativas antes do ensino superior

A respeito de iniciativas que buscam melhorar esse panorama de queda é o investimento no ensino técnico no Brasil. O qual, por exemplo, oferece oportunidades para os estudantes que desejam se envolver na produção de pesquisas. Essa modalidade engloba uma variedade de cursos e programas em diversas áreas, como tecnologia, saúde, agronegócio, indústria, entre outros. Além disso, algumas instituições de ensino técnico estabelecem parcerias com universidades e centros de pesquisa, o que pode proporcionar aos estudantes acesso a uma infraestrutura ainda mais avançada e a possibilidade de colaborar em projetos científicos em andamento.

É importante destacar que, para ter suas pesquisas aceitas em revistas acadêmicas, esse público mais jovem deve seguir os mesmos critérios e rigor científico exigidos de outros pesquisadores. Isso implica em fundamentar o trabalho em uma metodologia adequada, apresentar resultados relevantes e contribuir para o avanço dos temas, discussões e reflexões nas áreas estudadas.

Muitos jovens pesquisadores, por já estarem em contato com suas instituições de ensino, têm a oportunidade de buscar orientação de professores, mentores ou outros profissionais da área para aprimorar suas pesquisas, escrever o artigo e submetê-lo às revistas acadêmicas. Existem até mesmo revistas acadêmicas específicas para jovens pesquisadores, que valorizam o trabalho de estudantes do ensino médio e universitário.

O que vale ser ressaltado é que cada revista possui seu próprio processo de seleção, análise e revisão de produções. Portanto, é importante seguir as instruções fornecidas por cada revista. Esses processos podem ser desafiadores, por conta de vários fatores:

 

  1. Competição acirrada: As revistas acadêmicas geralmente recebem um grande número de submissões, mas possuem um espaço limitado para publicar artigos. Isso cria uma competição acirrada, o que torna difícil a aceitação de um artigo, mesmo que seja de alta qualidade.
  2. Rejeição inicial: Muitos artigos são rejeitados logo na fase inicial da avaliação, antes mesmo de passarem pela revisão por pares. As razões para a rejeição podem incluir falta de relevância para o escopo da revista, metodologia inadequada ou problemas de escrita.
  3. Revisões por pares rigorosas: A maioria das revistas acadêmicas segue o processo de revisão por pares, no qual os artigos são avaliados por especialistas na área antes de serem aceitos para publicação. Os revisores podem oferecer críticas e sugestões detalhadas, que exige dos autores a realização de revisões e melhorias no artigo.
  4. Tempo de revisão demorado: O processo de revisão por pares pode levar bastante tempo e os revisores possuem um período para avaliar os artigos. Assim, o processo de comunicação entre autores, revisores e editores pode ser demorado. Nesse sentido, a espera pode ser frustrante, especialmente quando os resultados da pesquisa são urgentes ou quando o artigo faz parte da progressão na carreira acadêmica.
  5. Idioma e estilo de escrita: Para publicar em revistas acadêmicas internacionais, é necessário ter um bom domínio do idioma inglês, ou seja, escrita precisa ser clara, precisa e seguir as regras acadêmicas específicas do campo pode ser um desafio para escritores cuja língua materna não seja o inglês.
  6. Custos associados: Alguns periódicos cobram taxas de publicação (conhecidas como taxas de processamento de artigo) para arcar com as despesas de revisão, edição e publicação, dessa forma as taxas podem ser um obstáculo para pesquisadores com recursos limitados.

 

Para superar essas dificuldades, é necessário demonstrar perseverança, familiarizar-se com as diretrizes e expectativas das revistas acadêmicas, além de desenvolver habilidades de escrita e confiança na apresentação da pesquisa. É fundamental ter em mente que a rejeição de um artigo por uma revista não deve ser encarada como um fim, mas sim como uma oportunidade de aprendizado. Utilizar os feedbacks recebidos para aprimorar o trabalho e, posteriormente, submetê-lo a outras publicações pode ser um caminho para obter sucesso na divulgação de suas descobertas científicas.

A respeito da produção acadêmica, Renan Oliveira afirma: “O ensino superior não deve se limitar a conceder diplomas. É crucial que as novas gerações tenham espaço para produzir conhecimento e realizar pesquisas de qualidade. Isso permite a renovação da verdade, a abordagem de novos problemas e a busca de soluções inovadoras.”

Nesse aspecto, é possível encontrar soluções de como aprimorar o formato e conteúdo de publicações através de outras publicações. Fernando A. Ribeiro Serra, Doutor em Engenharia pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ), Gabriela Gonçalves Fiates, Doutora em Engenharia de Produção pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), e Manuel Portugal PhD em Administração pela Universidade de Utah escreveram o artigo “Publicar é Difícil ou faltam competências? O desafio de pesquisar e publicar em revistas científicas na visão de editores e revisores internacionais”, veja a seguir uma tabela adaptada pela produção dos autores que pode contribuir com algumas das principais questões na hora da escrita de artigos:

(Retirada da Revista de Administração Mackenzie de 2008, Volume 9, n° 4, edição especial (p. 32-55)

 

Outras Perspectivas

Um estudo da Associação Nacional de Pós-Graduação em Ciências Sociais (ANPOCS) realizou o estudo “Futuros do trabalho nas Ciências Sociais”, realizado com apoio da ABA, ABCP e SBS. Lançado no mês de maio de 2023, a pesquisa buscou avaliar alguns cenários comuns a pesquisadores brasileiros e apontou que 20,9% dos respondentes já cogitaram em desistir da carreira acadêmica por cortes de recursos para educação e Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI).

Outros 22,32% dos participantes relataram que a dificuldade de encontrar oportunidades na área foi uma das razões pelas quais cogitaram desistir de suas carreiras. É importante ressaltar que o relatório destaca uma questão fundamental relacionada à raça, que se sobrepõe à questão de gênero. Pessoas autodeclaradas pretas ou pardas apresentaram um percentual ainda maior quando se trata de considerar desistir de suas carreiras em comparação com pessoas autodeclaradas brancas.

Sobre esse assunto, a professora e pesquisadora do Instituto de Artes da Universidade Estadual de Campinas (IA-UNICAMP), Denise Carvalho dos Santos Rodrigues, menciona que “é fundamental destacar a importância de políticas que promovam equidade de acesso para mulheres em suas diversas especificidades, como mulheres indígenas, mulheres negras, mulheres quilombolas, mulheres com deficiência visual, entre outras. É necessário combater a discriminação e a exclusão que ocorrem nas interseccionalidades, que vão além do gênero e envolvem origem, características e particularidades que podem intensificar as formas de discriminação e o capacitismo”.

Dentro do tema de dificuldades de pesquisadores que atuam na área acadêmica, a questão do machismo e misoginia faz parte da rotina de muitas mulheres. Em 2019, por exemplo, na Universidade de Brasília (UnB), as mulheres representam mais da metade das vagas no mestrado e no doutorado, ao ocupar 52% e 53% das posições, respectivamente. Nos programas de iniciação científica, elas chegam a representar 62% dos participantes. No entanto, o número diminui consideravelmente quando se trata das posições de destaque acadêmico. De acordo com dados fornecidos pela própria UnB, em todo o país, as mulheres ocupam apenas 7% das posições de topo na carreira científica.

Carvalho conta: “um dos diagnósticos que encontrei em minhas leituras, com base em uma publicação de 2017, destacava a dificuldade das mulheres em terem seus trabalhos de pesquisa publicados em periódicos científicos. Essa situação afetava significativamente a maneira como os trabalhos das mulheres eram citados e reconhecidos. Outro elemento que chamou minha atenção foi a menor probabilidade de as mulheres colaborarem em cargos de gestão acadêmica. Havia uma maior presença de homens em posições de liderança, mesmo quando se considera, por exemplo, o percentual de reitoras nas universidades públicas. Isso evidencia que o acesso a essas posições de decisão e liderança continua predominantemente favorecendo os homens. Essa disparidade influencia diretamente as questões discutidas e as necessidades levantadas, pois a menor representação feminina limita a visibilidade de demandas relacionadas a outros gêneros, especialmente as mulheres”.

Conforme a Organização dos Estados Ibero-americanos (OEI), o Brasil é o país ibero-americano (países americanos que foram colonizados por Portugal e Espanha) com a maior proporção de artigos científicos assinados por mulheres, seja como autora principal ou coautora. Entre 2014 e 2017, o Brasil publicou aproximadamente 53,3 mil artigos, sendo que 72% deles foram assinados por pesquisadoras mulheres. Em seguida, aparecem a Argentina, Guatemala e Portugal, com a participação de mulheres em 67%, 66% e 64% dos artigos publicados, respectivamente. Já El Salvador, Nicarágua e Chile estão no extremo oposto, com a participação de mulheres em menos de 48% dos artigos publicados por cada país.

Carvalho reforça que, o estudo “Gender in the Global Research Landscape” (Gênero no Panorama Global de Pesquisa) lançado em 2017 pela Elsevier — empresa editorial holandesa especializada em conteúdo científico, técnico e médico — destaca três desafios que ela considera significativos ao observar esse cenário e um deles é a falta de acesso das mulheres a ambientes acadêmicos e espaços de liderança por existirem códigos e regras estabelecidos para proteger espaços de poder.

A professora da UNICAMP ainda completa que “a participação desigual de homens e mulheres nas atividades acadêmicas acaba estimulando a produção de conhecimentos e concepções epistemológicas que são considerados hegemônicos, resultando em produções científicas com traços androcêntricos, mesmo que de forma sutil.”

Em outro prisma muito semelhante, a participação de pessoas transgênero no meio acadêmico ainda está longe de possuir tanto representatividade quanto espaço. De acordo com a V Pesquisa Nacional de Perfil Socioeconômico e Cultural dos(as) Graduandos(as) das Instituições Federais de Ensino Superior (Ifes) de 2018, apenas 0,3% da população universitária federal do país se identificou como pessoa trans. Isso equivale a menos de 1 estudante trans para cada 100. A ausência de dados provenientes das instituições de ensino superior dificulta ainda mais a compreensão desse cenário, uma vez que cerca de 30% delas não compartilharam suas informações.

“Esse estudo revelou a vulnerabilidade em que as pessoas transgêneros se encontram, como a dificuldade em concluir a educação básica e ter acesso ao ensino superior. É extremamente necessário que universidades, como a UFBA, tenham cotas para pessoas trans, pois muitas vezes essa população acaba na prostituição sem conseguir concluir o ensino médio. Precisamos resolver o problema da transfobia na sociedade, que leva à expulsão de jovens trans desses espaços e de suas casas, principalmente na faixa etária de 14 a 16 anos”, diz Hell Mello, não binário formado em Serviço Social pela Universidade Cidade de São Paulo e especialista em “Acessibilidade, Diversidade e Inclusão” pela UNISE, que atua como pesquisador no Projeto de Extensão Universitária do NEV/USP, o Projeto Observatório de Direitos Humanos em Escolas (PODHE).

Ao questionar Carvalho sobre que tipo de medidas poderiam ser adotadas para incentivar e fortalecer o reconhecimento e a carreira acadêmica no Brasil, a pesquisadora aponta: “Primeiramente, é importante estabelecer um processo contínuo de crítica e autocrítica na academia, buscando a desconstrução de estruturas enviesadas e a ressignificação desses elementos. Em seguida, é essencial combater a invisibilidade dos processos de falta de equidade e discriminação de gênero, pois essa invisibilização pode desarticular os esforços de ressignificação e mudança. O reconhecimento do problema e a eliminação progressiva dessa invisibilidade são fundamentais para avançar em direção à resolução dessas questões.”

A pesquisadora complementa também que é importante estimular a elaboração de políticas específicas que contribuam para diminuir a falta de equidade de gênero. Essas políticas devem abranger não apenas mulheres cisgênero, mas também mulheres transgênero, ao considerar a exclusão ainda maior enfrentada por esse grupo. A questão da equidade de gênero não é um problema restrito ao Brasil, assim como a falta de recursos, pesquisadores e acadêmicos têm observado que a desigualdade de gênero e a necessidade de políticas para remodelar o contexto é uma preocupação internacional.

 

A produção internacional

De acordo com informações da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), o Brasil, em 2018, apresentava cerca de 700 pesquisadores por milhão de habitantes, o que constitui o segundo melhor índice na América Latina, ficando atrás apenas da Argentina. No entanto, esse número ainda está significativamente abaixo dos registros de países como China, Rússia, União Europeia, Estados Unidos, Coreia do Sul, Singapura e Israel.

A partir desse cenário, uma ferramenta que também pode auxiliar na pesquisa por revistas e periódicos científico, que pode facilitar o intercâmbio desse conteúdo, é a plataforma Edanz – Journal Selector que oferece aos pesquisadores uma lista de periódicos recomendados para a publicação de seus artigos, com base no tema da pesquisa. Em muitos casos, a escolha de um periódico para publicar um trabalho é considerada um grande desafio enfrentado por pesquisadores, tanto no âmbito nacional quanto para pesquisadores fora do eixo de produção científica dos Estados Unidos e da Europa.

Uma pesquisa realizada com mais de 300 cientistas chineses que publicam regularmente pela Edanz Group, uma consultoria que auxilia pesquisadores de países não falantes de inglês a obter a aceitação de seus artigos em revistas internacionais, revelou essa constatação: quando questionados sobre o principal obstáculo durante a redação de um artigo científico para publicação, 118 pesquisadores chineses responderam que a dificuldade estava em escolher uma revista científica adequada.

Além disso, outros 70 participantes da pesquisa relataram ter dificuldade em expressar claramente suas ideias em inglês, que é considerado a língua “oficial” da ciência. Por sua vez, 73 pesquisadores chineses indicaram ter problemas para compreender as diretrizes dos periódicos para os autores. Além disso, 63 pesquisadores disseram enfrentar dificuldades na formatação de seus artigos de acordo com as diretrizes dos periódicos.

Essas barreiras linguísticas e editoriais são um aspecto que pode afetar a capacidade de publicação de trabalhos, mesmo em revistas acadêmicas conceituadas que deveriam ter uma capilaridade de instituições intermediadoras.

Por todas essas razões, enviar um artigo acadêmico ou produções não acadêmicas, como as citadas no início do texto, para o dossiê que pesquisadores do NEV/USP estão organizando representa uma oportunidade real de participar pela primeira vez do mundo da produção acadêmica do conhecimento, principalmente para adolescentes e jovens. Veja mais informações sobre o dossiê no link a seguir:

https://nev.prp.usp.br/noticias/24-5-2023-dossie-da-revista-latino-americana-de-ciencias-sociales-ninez-y-juventud-sera-coordenado-por-pesquisadores-do-nev-e-recebe-artigos-ate-31-de-outubro/

 

Texto: Caio Andrade – Comunicação – NEV/USP

Edição: Cristina Uchôa – Comunicação – NEV/USP