Justiça para Moïse Mugenyi: outra vítima de uma guerra chamada racismo

07/02/2022

As pesquisadoras e os pesquisadores do Núcleo de Estudos da Violência da USP manifestam sentimento de indignação com o brutal assassinato do jovem congolês Moïse Mugenyi Kabagambe, ocorrido no dia 24 de janeiro de 2022 no quiosque onde ele trabalhava na praia da Barra da Tijuca.

Moïse teve seus pés e mãos amarrados e foi espancado até a morte após cobrar pagamentos atrasados referentes a dois dias de trabalho. Esse jovem migrou com a família da República Democrática do Congo para o Brasil em busca de refúgio e melhores condições de vida. No entanto, encontrou no país, tido como “pátria mãe acolhedora”, uma violência cotidiana que faz com que pessoas como ele – jovens negros, periféricos, (i)migrantes, pobres – tenham seus direitos humanos constantemente desrespeitados. O que esse grupo encontra na realidade são os trabalhos precarizados, as péssimas condições de moradia e a constante ameaça de serem interpelados como “bandidos”, sujeitos a todo tipo de violência psicológica e física.

O assassinato de Moïse é, sem dúvida, uma manifestação das características racistas e xenofóbicas da sociedade brasileira. É sobretudo o racismo que normaliza este e outros casos recorrentes, como o de João Alberto Silveira Freitas, também espancado até a morte por seguranças do supermercado Carrefour, em Porto Alegre; ou de Durval Teófilo, morto a tiros por um sargento da Marinha, ao voltar do trabalho para casa; ou ainda de Evaldo dos Santos, fuzilado com 80 tiros por oficiais do Exército, quando se deslocava de carro para um chá de bebê, entre tantos outros casos cotidianos que vitimizam, em sua maioria, negros e negras.

A ausência de qualquer comentário por parte do Presidente da República sobre o assassinato de Moïse; a cobertura dada ao caso pela grande mídia, ao ressaltar os conflitos armados do Congo, ao invés de problematizar as violências nossas de cada dia; as justificativas usadas pelos agressores, nos diferentes casos, e frequentemente reportadas por essa mesma mídia – “Moïse estava bêbado, causando confusão”, “Durval estava se aproximando muito rápido do meu carro”, “Evaldo foi morto por engano” -,  tudo isso escancara a forma como o racismo desvaloriza as vidas negras e se fortalece quanto mais ignora a responsabilidade coletiva e o caráter sistêmico dessas violências.

A recorrência de casos como estes ameaça a consolidação de uma sociedade justa e democrática no país. Por isso, o Núcleo de Estudos da Violência soma esforços a uma série de movimentos sociais e entidades – como a Anistia Internacional Brasil, a Coalizão Negra por Direitos, o Coletivo de Mães da Maré, o Grupo Tortura Nunca Mais-RJ e Viva – para explicitar a dimensão social e política do problema, manifestar solidariedade a Moïse e sua família e reforçar a responsabilidade de todas(os) em pressionar as autoridades para que investiguem devidamente casos como esse e implementem políticas públicas de prevenção às violências racistas.